Por Rafael Alberto
De Roma, onde
participa da 3ª Assembleia Extraordinária do Sínodo dos Bispos, sobre
os desafios da família no âmbito da evangelização, o Cardeal Odilo
Pedro Scherer – que é membro do Conselho do Sínodo – falou com
exclusividade ao O SÃO PAULO sobre questões delicadas debatidas pelos
padres sinodais na primeira semana de trabalhos. Com a divulgação do Relatório
que compila esses debates, as reações e repercussões em relação ao texto deram
a impressão de que se trataria já de uma decisão final do Sínodo. Dom Odilo
esclarece que o texto é apenas uma síntese e ainda deverá ser trabalhado ao
longo desta semana. “Portanto, não se tratou ainda de um ‘documento’ final do
Sínodo, nem de ‘decisões’ do Sínodo”, enfatizou.
O SÃO PAULO – O
relatório apresentado no dia 13 de outubro já é uma palavra final do Sínodo? Do
que se trata?
Cardeal Odilo Pedro Scherer – O
Relatório apresentado no dia 13 de outubro pelo Cardeal Peter Erdö, de
Budapeste, relator do Sínodo, foi uma síntese das mais de 200 reflexões
apresentadas pelos participantes no plenário do Sínodo ao longo da primeira
semana de trabalhos. O relator, ajudado pelo secretário especial do
Sínodo, tentou reproduzir um resumo orgânico das muitas posições que foram
aparecendo. Nos trabalhos desta semana, os diversos grupos menores estão
propondo novas contribuições e ajustes, aperfeiçoando o texto do Relatório, que
deverá ser votado antes da conclusão dos trabalhos desta assembleia do Sínodo.
Portanto, não se tratou ainda de um “documento” final do Sínodo, nem de
“decisões” do Sínodo.
O relatório afirma
que, sem negar as problemáticas morais decorrentes das uniões entre pessoas do
mesmo sexo, em alguns casos a relação de apoio mútuo é benéfica aos parceiros.
Isso foi interpretado pela mídia como a primeira vez que a Igreja estaria
reconhecendo algum valor nas uniões homoafetivas. Como foram os debates sobre
esse assunto?
O tema das uniões
civis de pessoas do mesmo sexo estava previsto no instrumento de trabalho,
anterior ao Sínodo e, portanto, também foi abordado em algumas reflexões
apresentadas na assembleia. A avaliação da Igreja em relação às uniões
homossexuais não mudou, o que também fica claro no mesmo Relatório apresentado,
mas isso não impede de reconhecer que haja coisas boasnas pessoas
homossexuais. A reflexão do Sínodo sobre esses casos foram orientadas pela
preocupação de acolher essas pessoas na Igreja e de ajudá-las, de maneira, para
que também possam receber o Evangelho de Cristo e vivê-lo, como é proposto a
todos. Mais uma vez, o Sínodo afirmou o que já é conhecido: essas pessoas não
estão excluídas da Igreja, mas são convidadas a acolher o Evangelho e a vivê-lo
de maneira fiel, como todas as demais.
Que rumo tiveram os
debates do Sínodo sobre a sagrada comunhão a ser dada a pessoas divorciadas e
casadas novamente no civil?
Evidentemente, essa
questão esteve bem presente nas reflexões
da assembleia sinodal; as tendências manifestadas foram, sobretudo, três: a)
manter a atual posição, no sentido de não dar a santa comunhão e, para isso,
foram apresentadas várias justificações teológicas relevantes; b) abrir a
possibilidade do acesso à
santa comunhão em casos determinados e em situações bem consideradas; para isso
foram apresentadas várias razões pastorais importantes; c) agilizar mais o
atendimento, nos tribunais eclesiásticos, de eventuais situações de nulidade
matrimonial, para que muitos casais possam regularizar a sua situação canônica
e receber os sacramentos. Em todo caso, há um desejo forte do Sínodo de ajudar
da melhor forma possível os casais que vivem essa situação, para que possam
participar de maneira mais plena da vida da Igreja. A solução, porém, não
deverá ser resolvida por um simples “pode” ou “não pode”.
Quais outras
grandes questões estão surgindo no Sínodo?
A tônica geral foi
de apreço pelo casamento e a família, que fazem parte do Evangelho e cujo zelo
a Igreja considera parte de sua missão evangelizadora e pastoral; notou-se a
necessidade generalizada de retomar a evangelização no mundo da família; causou
forte impressão a perda de apreço pelo casamento e a família, sobretudo no
mundo ocidental; também tiveram a sensibilidade do Sínodo as situações de
milhões de famílias que vivem os tormentos da guerra, das perseguições, da
violência, da miséria, das migrações forçadas e tantos outros empecilhos a uma
vida familiar serena. A tônica geral do Sínodo está sendo a da atenção
samaritana da Igreja em relação às muitas situações de fragilidade e de
sofrimento das famílias, junto com a valorização de tudo o que possa haver de
bom e construtivo nas diversas situações e condições da família, apesar das
insuficiências e precariedades em que vive. E o Papa Francisco, que acompanha a
tudo com muita atenção, encorajou a todos a terem coragem, liberdade e
franqueza para falar.
O Relatório deverá
agora ser trabalhado nas Igrejas Particulares. Em São Paulo, o senhor já tem
planos para fazer isso acontecer?
O texto final desta
assembleia extraordinária do Sínodo ainda não será um “documento final”, mas
será novamente remetido às Conferências Episcopais e às Dioceses, para que
reflitam sobre ele e apresentem novas contribuições para as questões postas. O
Papa Francisco quer que a Igreja faça um “caminho sinodal” e, assim, participe
da busca de caminhos a serem feitos em comum (sínodo significa isso).
Vamos aguardar que o próprio Sínodo e o Papa Francisco deem as orientações para
esse trabalho, que agora vai prosseguir em vista da 15ª Assembleia Ordinária do
Sínodo, em outubro de 2015; esta deverá ter ainda o mesmo tema da família, mas
com enfoques novos: “a vocação e a missão da família no mundo contemporâneo”.