Por Edcarlos Bispo e Nayá Fernandes
Desde 2004 tramita no Congresso um Projeto de Lei (PL) que
versa sobre as questões da terceirização do trabalho. Após dez anos, o projeto
não foi aprovado, porém, sua discussão foi reacendida e a quebra de braço entre
parlamentares, empresários e centrais sindicais está a todo vapor.
No centro da discussão, aproximadamente 20 milhões de trabalhadores
terceirizados não possuem uma legislação que garanta seus direitos e os
protejam. Ouvindo alguns lados dessa história, O SÃO PAULO apresenta
dados e explicações sobre esse fato.
Para começar, a visão jurídica da matéria
No Brasil, a terceirização é um fenômeno que tomou fôlego a
partir de 1990. Antes, sua prática era restrita, considerando-se lícita apenas
a prestação de serviços de conservação e limpeza. Toda contratação intermediada
era considerada fraudulenta, gerando vínculo empregatício dos trabalhadores
terceirizados com a empresa tomadora dos serviços respectivos.
Essa orientação, que se encontrava em rota de colisão com
tendência universal - no sentido da terceirização como prestação de serviços
especializados - veio a ser atenuada com a edição do Enunciado nº 331, do
Tribunal Superior do Trabalho (TST), ‘verbis’: “Não forma vínculo de emprego
com o tomador a contratação de serviços de vigilância (lei nº 7.102, de
20.6.83), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados
à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e
subordinação direta”, explicou, ao O SÃO PAULO, Gabriela Campos Ribeiro,
advogada trabalhista e doutora em Direito pela USP.
Gabriela comentou também que desde janeiro de 1994 – data da
publicação do referido Enunciado 331, hoje Súmula 331 do TST – tornou-se
possível a terceirização de atividade-meio das empresas. “Um hospital, por
exemplo, passou a poder contratar, com empresas de colocação de mão de obra, os
serviços de cozinheiro ou de recepcionista”, explicou.
A partir daí, a terceirização se popularizou no Brasil.
“Hoje ela é amplamente praticada, sendo que não se forma vínculo diretamente
entre os trabalhadores terceirizados – trabalhadores empregados da empresa
prestadora de serviços que atuam em favor do tomador de serviços – desde que
não sejam diretamente subordinados ao tomador e desde que a terceirização seja
feita em atividades-meio”, continuou a advogada, ao ressaltar que “a
terceirização de atividade-fim é repudiada pelos nossos tribunais. Ainda assim,
a empresa tomadora de serviços precisa ser muito cautelosa na escolha da
empresa para a qual irá terceirizar serviços, pois terá responsabilidade
subsidiária em caso de inadimplemento das obrigações trabalhistas”.
Direitos e deveres de cada um
Os trabalhadores terceirizados têm os mesmos direitos dos
demais trabalhadores regidos pela CLT. Sendo lícita a terceirização, eles terão
além dos benefícios legais (salário, DSR, férias com 1/3, décimo terceiro
salário, FGTS, entre outros), têm os benefícios da Convenção Coletiva aplicável
à sua categoria profissional. A Convenção Coletiva aplicável ao trabalhador
terceirizado é normalmente diferente da Convenção Coletiva aplicável aos
trabalhadores da tomadora de serviços, pois no Brasil o enquadramento sindical
que define a categoria profissional de cada trabalhador é dado pela atividade
econômica preponderante do empregador.
O responsável principal pelo trabalhador terceirizado é o
seu empregador, ou seja, a empresa prestadora de serviços. Se ele sofrer um
acidente do trabalho a empregadora deve acolhê-lo e tomar as providências para
que o acidente seja comunicado aos órgãos oficiais e ele, se for o caso, seja
afastado para que entre no gozo de benefício previdenciário. Se o acidente
decorrer de culpa ou dolo do empregador ou de terceiro (tomador de serviços)
podem o empregador e o tomador de serviços ser responsabilizados e ter de pagar
indenização por perdas e danos e por dano moral, dependendo da gravidade do
evento.
Além disso, é importante esclarecer que a jurisprudência
trabalhista se consolidou no sentido de que, em principio, na terceirização
lícita, não haverá responsabilidade solidária, mas apenas subsidiária. A
solidariedade aparecerá na terceirização ilícita e em situações previstas em
lei (fraude, abuso de direito etc).
Na opinião de Gabriela, a terceirização é uma boa opção
quando alguém tem um conhecimento especializado e consegue atender melhor e com
mais eficiência os seus clientes. “ A terceirização não pode ser pensada como
mecanismo para fragilizar direitos trabalhistas ou forma de intermediação
fraudulenta de mão de obra. Quem terceiriza está delegando a outrem algo que o
outro faz melhor e com expertise.
Entenda:
Atividade-meio e atividade-fim
A atividade-fim da empresa é o principal produto ou serviço
que ela presta ou desenvolve. Isso pode ser verificado em seu contrato social e
no seu CNAE (Código Nacional de Atividade Econômica). A atividade-meio é aquela
realizada como instrumento para chegar ao fim. Serviços de limpeza, segurança,
informática, são imprescindíveis para a atividade bancária, por exemplo, mas
não são o “core business” de um Banco.
*Gabriela Ribeiro
Atenção!
Ao contratar ou ser contratado por uma empresa terceirizada,
pesquise sobre como aquela empresa trata seus funcionários no que se refere à
tempo de serviço, salário, décimo terceiro, férias, seguro saúde e seguro em
caso de acidentes.