Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte (MG)
Na raiz das muitas crises que a sociedade brasileira
enfrenta - hídrica, energética, política, econômica, moral, com a exigência de
pronta reação - está a falta de consciência. Uma carência que produz absurdos
em série. São incontáveis os prejuízos para a coletividade que resultam da
falta de princípios éticos e morais. Uma deficiência que é fonte de
arbitrariedades, desmandos, incompetência para reações e respostas. Promove a
perda dos sentidos de beleza, justiça e equilíbrio, que devem ser construídos cotidianamente,
para se evitar situações ainda mais caóticas.
Há crise de consciência? Esta interrogação ganha pertinência
quando se constata extremismos e desequilíbrios na sociedade, em atitudes
individuais e coletivas, fundamentadas na irracionalidade e abominável
mesquinhez. Um exemplo? A recente notícia de que parlamentares votaram um
auxílio moradia em benefício de quem não precisa. Trata-se do princípio de
“usufruir das vantagens”, que tudo corrói, de maneira demolidora, inclusive o
tecido da consciência social, política. Esse princípio é impulsionado por uma
perigosa permissividade, que justifica atos individuais e coletivos,
merecedores da indignação de homens e mulheres de bem, no exercício do direito
de exigir o tratamento adequado do que é público.
Não conseguir debelar o crescente processo de falta de
consciência cidadã é um caminho para a ruína da sociedade. Essa constatação é
reforçada ao observar fenômenos recentes que devem ser motivo de preocupação: a
violência que não para de crescer, a miséria que faz tantos sofrerem, a
presença de grupos interesseiros, especializados em corrupção, que tornam
pantanoso o caminho da sociedade, comprometendo avanços e a construção da
cultura da vida.
A falta de consciência revela-se de alta gravidade. Muitos
agem como devastadores do erário e, pior, tratam de modo predatório os bens da
criação. Ora, o mínimo que se pode esperar de cada cidadão é uma conduta
balizada pela moralidade. E essa deve ser a postura e o compromisso de quem
representa o povo e dirige instâncias governamentais mantidas com dinheiro
público. Na contramão do compromisso ético-moral, certamente por perda e
esgarçamento da própria consciência, indivíduos e grupos agem cegamente,
inspirados só pelos interesses próprios. Perdem a credibilidade, o que aumenta
a crise e deflagra uma verdadeira situação de “pé de guerra”. Esses cenários de
descompassos colocam em pauta uma urgente necessidade: o tratamento da falta de
consciência, problema grave e central na sociedade brasileira.
Há um comprometimento sério da consciência moral, comprovado
em atitudes inadequadas, em nível individual e institucional. Infelizmente,
para impor o próprio interesse, garantir a benesse, consolidar o usufruto de
vantagem, vale tudo. Isso gera sérias consequências que efetivam a perda do
gosto pela honestidade, do respeito aos limites que possibilitam contentar-se
eticamente com o que é justo. A falta da consciência moral, que compromete a
conduta honesta, para ser vencida, requer verificações em âmbitos muito
complexos da sociedade. Paga-se alto preço pela relativização de normas
objetivas e absolutas. O atual contexto cultural tem grande influência nesse
processo, pois favorece o enfraquecimento de princípios inegociáveis e
fundamentais ao exercício da cidadania.
Autonomia e liberdade não são justificativas para se fazer
tudo o que se quer, leiloando princípios ético-morais básicos que alimentam o
bom senso. Princípios capazes de fazer crescer o apreço não pelo que se lucra e
se ajunta, mas pela honestidade e respeitável conduta cidadã. É hora de
reagir à perda da consciência moral.
Uma possibilidade de reação a esse problema, com incidência
em todas as dinâmicas sociais, é conhecer profundamente e vivenciar os valores
do Evangelho, guiados pelo Mestre mais completo de todos os tempos, na sua
condição de Deus e Homem. Enquanto se reage para debelar a crise pela perda da
consciência moral, raiz e vetor de outras graves crises, espera-se que as
instituições respeitem as leis, que os representantes estejam, verdadeiramente,
a serviço do povo, que cada pessoa se reconheça e participe como cidadão. A
recuperação da moralidade deve fazer crescer uma incômoda crise de consciência,
capaz de reconduzir a sociedade para o caminho do bem, da verdade e da justiça.