Em entrevista originalmente concedida para o portal G1, ao jornalista Ardilhes Moreira, o arcebispo de São
Paulo, cardeal Odilo Pedro Scherer, falou sobre a associação feita entre as
duas seleções finalistas da Copa do Mundo e os papas Francisco (argentino) e
Bento XVI (alemão).
Com o Brasil fora da disputa, após ser derrotado pela
Alemanha pela histórica goleada da última terça-feira, 8, o Cardeal
ressalta que “no jogo da vida, o povo brasileiro precisa continuar a
lutar, com coragem e perseverança” para vencer problemas como a pobreza e
corrupção.
Confira a íntegra.
Dom Odilo, a maioria dos relatos sobre a realização da Copa
no Brasil é positiva: receptividade dos brasileiros elogiada pelos turistas,
poucos incidentes. É possível dizer, a partir da experiência da Jornada da
Juventude, que essa sensação que os turistas do futebol estão conhecendo agora
os peregrinos de Francisco já tinham experimentado?
Dom Odilo – Sim, embora sejam dois eventos distintos.
Na Jornada Mundial da Juventude, essa mesma experiência, talvez, tenha sido até
mais profunda, porque se criaram encontros e laços mais próximos dos jovens
estrangeiros com pessoas e comunidades locais de todo o Brasil; e, no Rio de
Janeiro, houve uma enorme multidão de jovens convivendo de perto durante uma
semana com a população local.
O senhor teve chance de acompanhar os jogos? Ou ao menos
parte deles? O que achou do aspecto esportivo: viveu alguns bons momentos
de diversão?
Dom Odilo – Assisti pela TV os jogos do Brasil e alguns
outros. A Copa do Mundo sempre envolve muito; o aspecto esportivo foi
interessante, houve jogos de bom nível e criou-se uma interação bonita entre
torcidas. Creio que o evento contribuiu para a aproximação de povos e para a
cultura da paz. A Copa no Brasil está bonita, apesar de o “sonho” brasileiro,
do título, não ter sido alcançado.
A Copa foi antecedida por protestos específicos sobre sua
realização e gastos. Acredita que esses protestos, quando não violentos, deixaram
uma proposta de reflexão?
Dom Odilo – Certamente. As questões levantadas durante
os protestos democráticos precisam ser levados em conta nos debates políticos e
culturais após a Copa.
Ao fim, tivemos uma final Argentina e Alemanha. Muitos
lembram que os países dos dois papas estarão em disputa. Pelo que o senhor
conhece da convivência com ambos os papas, quem deve estar mais “ligado” no
tema? Considerando a “brincadeira”, poderíamos dizer que essa é a final dos
sonhos para os católicos, já que assim ambos os países estariam em pé de
igualdade no Vaticano?
Dom Odilo – Não tenho dúvidas de que o papa
Francisco está mais ligado ao evento da Copa, pois é sabido que ele é um
apreciador do futebol em seu país. É inevitável que as torcidas também tentem
envolver as duas personalidades da Igreja... Mas não creio que venha ao caso de
se falar em “final dos sonhos para os católicos”... O apreço da Igreja e dos
católicos pelos países e povos está acima do êxito maior ou menor destes nos
esportes.
Depois de o Brasil ter sido eliminado, o senhor lembrou que
jogo é jogo e agora é momento de “cair na real”. Hoje, quais as principais
ameaças que os brasileiros sofrem nesse “jogo da vida”?
Dom Odilo – No jogo da vida, o povo brasileiro precisa
continuar a lutar, com coragem e perseverança, pela vitória sobre a
pobreza, pelo convívio social pacífico, sem discriminação ou violência,
pelo respeito ao próximo, a superação da corrupção em todos os âmbitos, pela
educação e saúde de qualidade ao alcance de todos, por condições dignas de
moradia, trabalho e transportes. Aí todos são chamados a descer das
arquibancadas, para jogar contra adversários que não chegam de longe... Esta
partida é nossa e esperamos ter boas vitórias nesse jogo, para a alegria de
todos!