Realizou-se na terça-feira, 5/11, no Vaticano, a conferência
de imprensa sobre a preparação da assembleia extraordinária do Sínodo dos
Bispos que será realizado em outubro de 2014, tendo como tema “Os desafios
pastorais da família no contexto da evangelização”. Intervieram: o Relator
Geral desta assembleia sinodal - cardeal Peter Erdo, arcebispo de Budapeste; -
D. Lorenzo Baldisseri, Secretário do Sínodo dos Bispos; e - D. Bruno Forte,
arcebispo de Chieti, Secretário Especial para este Sínodo.
Foi divulgado, entretanto o Documento de Preparação, que inclui um questionário com 38
quesitos que se deseja possam favorecer uma ampla consulta das bases, a começar
pelos casais e famílias e pelas paróquias em geral.
Sobre o conteúdo deste Documento e as novidades que de certo
modo ele representa, vejamos a leitura que dele deu, na coletiva de hoje, D.
Bruno Forte:
O tema escolhido pelo Santo Padre para a próxima Assembleia
Geral Extraordinária é: Os desafios pastorais para a família no contexto da
evangelização. Gostaria de sublinhar dois aspectos.
O primeiro diz respeito à atenção prioritária à evangelização,
à qual tudo se deve orientar no ser e no agir do povo de Deus. A Igreja não
existe para si mesma, mas para a glória de Deus e a salvação dos homens, e é
chamada para levar a alegria do Evangelho. Esta alegria deve ser proclamada a
todos, começando pela família, célula decisiva da sociedade e da própria
Igreja.
O segundo aspecto que gostaria de destacar é a dimensão
"pastoral" , acentuado na formulação do tema, a perspectiva com a
qual o Santo Padre nos convida a olhar o valor e os desafios da vida familiar
hoje. Se poderia definir esta dimensão com as palavras que o Beato João XXIII,
anotava no seu diário no dia 19 de Janeiro de 1962, no clima de preparação
próxima do Concílio: "Olhar tudo à luz do ministério pastoral , ou seja,
almas para salvar e edificar”. Não se trata, enfim, de debater questões
doutrinais, aliás já tornadas explícitas pelo Magistério também recente
(do Concílio Vaticano II na Constituição Pastoral Gaudium et spes 47-52, à
Exortação Apostólica Familiaris Consortio, de João Paulo II, em 1981), mas sim
de compreender como anunciar eficazmente o Evangelho da família no momento em
que estamos a viver, marcado por uma evidente crise social e espiritual.
O convite que daí resulta para toda a Igreja é de nos
colocarmos em escuta dos problemas e das expectativas que tantas famílias vivem
hoje, mostrando proximidade para com elas e propondo-lhes de forma credível a
misericórdia de Deus e a beleza de responder à sua chamada. Em particular, num
contexto como o da chamada "modernidade líquida" (Zygmunt Bauman), em
que já nenhum valor parece definido e a instituição da família é muitas vezes
contestada, se não completamente rejeitada, torna-se particularmente
significativo mostrar os caracteres profundamente humanizantes da proposta
cristã sobre a família, que nunca é contra ninguém, mas sempre e exclusivamente
a favor da dignidade e da beleza da vida de todo o homem, em cada homem, para o
bem toda a sociedade. .
Como tinham afirmado os Padres do Vaticano II, a família é
uma "escola de humanidade mais rica", no qual " , na qual “as
várias gerações se encontram e se ajudam mutuamente a alcançar uma sabedoria
humana mais completa e a compor convenientemente os direitos da pessoa com
as outras exigências da vida social "(Gaudium et Spes 52). Nesta linha,
o Documento preparatório da próxima Assembleia Sinodal afirma: " A
doutrina da fé sobre o matrimónio deve ser apresentada de modo
comunicativo e eficaz, para que ela seja capaz de atingir os corações e
transformá-los segundo a vontade de Deus manifestada em Cristo Jesus" (DP
II).
Atenção, acolhimento e misericórdia constituem o estilo
de que o Papa Francisco dá testemunho e que pede que se tenha para com todos,
incluindo as famílias dilaceradas e quem vive situações irregulares do ponto de
vista moral e canónico. Insiste sobre “a misericórdia divina e a ternura em
relação às pessoas feridas, nas periferias geográficas e existenciais”.
Sem dúvida que não é fácil viver em plenitude o Evangelho da
família, muitas vezes em condições de existência que tendem a minar até mesmo
os melhores esforços: pense-se - na fragilidade psicológica e afetiva nas
relações familiares; - no empobrecimento da qualidade das relações, convivendo
com casais aparentemente estáveis e normais; - no estresse originado
pelos ritmos hoje em dia impostos pela organização social, pelos tempos de
trabalho, pelas exigências de mobilidade. Torna-se mais vital do que nunca
conjugar o empenho quotidiano na família com condições que a apoiem tanto na
sociedade civil como na comunidade eclesial, motivando a beleza e a fecundidade
da fé na sacramentalidade do matrimónio e no poder terapêutico da penitência
sacramental.
Muitos são os desafios específicos e contextuais. Perfilam-se
no horizonte problemáticas inéditas até há poucos anos atrás, desde a difusão
dos “casais de facto”, que não acedem ao matrimónio e o não tomam em
consideração, até às uniões entre pessoas do mesmo sexo, às quais muitas vezes
é permitida a adopção de filhos.
Numerosas são também as situações contextuais novas, que
exigem especial atenção da parte da Igreja: - cultura do não-empenho; -
pressupor a instabilidade do vínculo; - reformulação da própria ideia de
família; - um difuso pluralismo relativista na concepção do matrimónio; e ainda
- propostas legislativas que desvalorizam a permanência e a fidelidade do pacto
matrimonial.
Estes desafios comportam sérias consequências pastorais.
Basta pensar nos muitos jovens, nascidos de matrimónios irregulares, que nunca
poderão ver os pais receber os Sacramentos. Compreende-se a urgência dos
desafios que se põem à evangelização, na situação actual, difundida por toda a
parte da “aldeia global”.
Tudo isto faz advertir como um dever urgente da caridade dos
Pastores em relação aos que lhe são confiados e a toda a família humana enfrentar
estas questões prementes. A vastidão deste empenho, a urgência dos temas e a
intensidade das expectativas levam a pedir a oração de todos para o percurso
empreendido, juntamente com a humildade, o empenho generoso e a confiança em
Deus de quem contribuirá para o Sínodo, para que o Espírito ilumine o trabalho
colegial e o discernimento final e decisivo do Sucessor de Pedro.