“Hoje, a Paz verdadeira desceu-nos do céu; hoje, os céus e a
terra espalham doçura; hoje, raiou o dia do novo resgate de eterna alegria, há
muito esperado!” – Estas palavras, a Igreja as reza por toda a terra no
Ofício das Vigílias desta Noite santa. Mas, por que tanta exultação? Por que
tanta luz? Por que tanta doçura, tanta ternura, tanta paz?
Hoje, cumpriu-se as Escrituras: o Dia tão esperado brilhou
no meio da noite. Hoje, “o povo, que andava na treva”, a humanidade
perdida e confusa, “viu uma grande luz; para os que habitavam nas sombras
da morte”, para nós, que temos sempre de lutar contra tantas e tantas
mortes, “uma luz resplandeceu!”. Nesta Noite, podemos comemorar,
alegrarmo-nos como os que colhem depois do trabalho e do suor do plantio,
porque algo inacreditável, algo que parece um sonho, um conto de fadas, nos
aconteceu! Escutai, escutai: “Nasceu para nós um Menino, foi-nos dado um
Filho; ele traz nos ombros a marca da realeza; o nome que lhe foi dado é:
Conselheiro Admirável, Deus Forte, Pai dos tempos futuros, Príncipe da Paz.
Grande será o seu reino e a paz não há de ter fim… a partir de agora e por todo
sempre!” Eis a graça, a glória, o mistério desta Noite! Por isso a
alegria: o Deus fiel cumpriu o que prometera e ultrapassou toda promessa. Nesta
Noite tão santa, tão única, tão cheia de frescor, como são comoventes as
palavras do Apóstolo na segunda leitura. Olhem o presépio, e escutem, olhem a
manjedoura e prestem atenção: “A graça de Deus se manifestou trazendo
salvação para todos os homens. Ela nos ensina a abandonar a impiedade e as
paixões mundanas e a viver neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade”. Olhem
o presépio! Olhem o presépio: a graça de Deus é uma Criança, o Menino que nos
foi dado! A graça de Deus está “envolvida em faixas e deitada numa
manjedoura”. Que graça pequeninha; que graça tão grande! Que graça tão frágil;
que graça tão forte! Quem é tão duro de coração, que não se comova? Quem é tão
desumano, que não se emocione? Quem é tão pecador, que não queira aproximar-se
de Deus? Quem é tão insensível, que não sinta, nesta Noite, o desejo de amar, o
desejo de ser bom, o desejo de paz, o desejo de se deixar abraçar por
Deus? “Não tenhais medo!” Quem quer que sejas tu: não temas! Não
tenhas receio pelos teus pecados, não te afastes da graça desta Noite por causa
das tuas infidelidades! Compreende: hoje, teu Deus vem a ti! Vem a ti a Paz,
vem a ti o Perdão, vem a ti a Misericórdia, vem a ti a Plenitude do teu coração
e o sonho da tua vida! Hoje nasceu para ti, para nós, um Salvador!
Presta bem atenção: porque tu és fraco, ele veio
sustentar-te; porque tu és inconstante, ele veio permanecer contigo; porque tu
muitas vezes não sabes o caminho, ele se vez visível na nossa carne; porque tu
vives em trevas, ele apareceu como luz; porque tu não podes subir a Deus, ele
desceu para te elevar! Que amor tão grande, que caridade sem medida! Nesta
Noite a Virgem deu à luz o próprio Deus na nossa humanidade mortal!
Por isso a alegria da Igreja, por isso, a exultação! Abramos
nosso coração, abramos nossa vida, nossos afetos, nossos sentimentos, nossos
projetos para o mistério desta Noite. No século V, são Leão Magno, Papa de
Roma, dizia ao povo na noite de hoje: “Hoje, amados filhos, nasceu o nosso
Salvador. Alegremo-nos! Não pode haver tristeza no dia em que nasce a vida; uma
vida que, dissipando o temor da morte, enche-nos de alegria com a promessa da
eternidade. Ninguém está excluído da participação nesta felicidade. Exulte o
justo, porque se aproxima da vitória; rejubile o pecador, porque lhe é
oferecido o perdão; reanime-se o pagão, porque é chamado à vida!”
Mas, estejamos atentos: porque Aquele que vem como luz no
meio da noite, vem pobre, humilde, pequeno, frágil… e somente poderá ser
reconhecido se estivermos atentos: atentos aos seus sinais, atentos às coisas
pequenas, atentos aos irmãos mais frágeis, atentos ao que no mundo parece a
toa, sem valor, sem importância, sem poder… O Menino somente pôde ser
encontrado e reconhecido pela pobre Virgem Maria, pelo humilde José, pelos
desprezados pastores… Os soberbos, os prepotentes, os esbanjadores, os
orgulhosos jamais receberão a graça desta Noite!
Então, ouçamos ainda as palavras do Papa são Leão; tomemos o
seu apelo para esta Noite: “Toma consciência, ó cristão, da tua dignidade!
Não voltes aos erros de antes por um comportamento indigno de tua condição.
Lembra de que cabeça e de que corpo és membro. Despojemo-nos, portanto, do
velho homem com seus atos; e tendo sido admitidos a participar do nascimento de
Cristo, renunciemos às obras da carne!”
Por tudo isso, concluamos como iniciamos, com as palavras da
Liturgia da Igreja: “Hoje, a Paz verdadeira desceu-nos do céu; hoje, os
céus e a terra espalham doçura; hoje, raiou o dia do novo resgate de eterna
alegria, há muito esperado! Cantai ao Senhor Deus um canto novo; cantai ao
Senhor Deus ó terra inteira… na presença do Senhor, pois ele vem!”
Feliz Natal a todos! Que reine no coração de todos a graça
desta noite! Amém.