quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

TEMPOS E COSTUMES


Dom Genival Saraiva
Administrador Apostólico da Arquidiocese da Paraíba

Num país democrático coexistem três níveis (municipal, estadual e federal) e três âmbitos (executivo, legislativo e judiciário) do Poder Público, cuja razão de ser é o bem comum. A vida de indivíduos e do povo, de uma ou de outra forma, está sempre relacionada com essas instâncias, no tocante aos seus direitos e deveres. Pra começar, os dados de identificação de uma pessoa começam com a naturalidade, o lugar onde nasce o cidadão, e a nacionalidade, que cria vínculos afetivos, sociais, culturais e políticos. Em razão disso, embora tenham nascido em municípios diferentes, por estarem localizados no Amapá ou na Paraíba, dois cidadãos sentem-se brasileiros com a mesma marca. É indiscutível que o cordão umbilical da cidadania liga a pessoa, mais proximamente, ao seu município de origem ou de moradia. Uma forma de expressão desse vínculo é a participação do cidadão, de forma mais apaixonada, na vida do município por ocasião das eleições, quando são escolhidos homens e mulheres para cargos executivos e legislativos.

Apesar de um maior rigor da legislação, nesse campo ainda há velhos costumes e muitos vícios, a exemplo do peso do poder econômico e da influência da mídia no processo eleitoral. Com a posse dos prefeitos e vereadores, a população está diante de novos tempos e velhos costumes. São novos tempos diante do mandato de 4 anos, mesmo quando ocorreu o caso da reeleição. A essa altura, passou o primeiro mês das novas administrações municipais. Na prática, mudança de administração nem sempre significa mudança de qualidade, não obstante tenha sido essa a tônica dos discursos no período eleitoral. Embora cedo, já se pode perceber, de certa forma, qual é a sinalização das novas administrações.

Provavelmente, na maioria dos municípios, está falando mais o continuísmo pragmático dos interesses pessoais, familiares e corporativos do que a inovação que tem como foco o bem comum. Nessa linha, basta considerar um elemento - a composição do quadro de auxiliares, e já se perceberá que o nepotismo e o apadrinhamento continuam acentuados em muitos municípios, com a nomeação de familiares e amigos, em lugar da contratação de pessoas qualificadas. Esse velho costume tem raízes muito sólidas, a ponto de encontrar sustentação em parágrafos ou alíneas de legislações aprovadas com nítidos interesses corporativistas. Alguns exemplos atestam isso. Alguns prefeitos e vereadores assumiram a função “sub iudice”, diante do que consta no registro de seu passado pessoal ou público. Outro exemplo: a questão salarial. Obviamente, a legislação é feita para atender a interesses; por isso, a legislação que aprova arrocho nos salários de servidores públicos contém dispositivos que favorecem à classe política e determinados segmentos do poder. Por essas e tantas outras coisas desse gênero, Dom Helder Câmara já afirmava, com razão, que “nem tudo que é legal é justo!”.

Como divulgam os meios de comunicação, muitas administrações encontraram seus municípios em estado de calamidade, em pontos essenciais na vida das pessoas e da coletividade, como salários atrasados, em muitos casos; lixo acumulado nas ruas de diversas cidades, um verdadeiro atentado à saúde pública. Diante de descalabro dessa natureza, não é difícil concluir que a gestão anterior, em razão de incompetência e/ou corrupção, cometeu erros e provocou males que estão afetando a vida das pessoas e o bem comum. Que estes novos tempos eliminem os velhos costumes administrativos!

Não deixa de ser oportuna a pergunta: como se comportará a sociedade organizada, através dos diversos canais de veiculação de suas aspirações, perante os poderes executivo e legislativo de seu município, nesse quadriênio que começou no dia 1º de janeiro?