Dom Murilo Krieger
Arcebispo de Salvador (BA)
Corinto era uma importante e próspera cidade marítima grega,
onde se cruzavam negociantes do Oriente e do Ocidente. A cidade tinha péssima
fama, pois nela havia um templo dedicado à deusa Afrodite, cultuada pela
prática da prostituição. Percebendo a importância dessa cidade para a expansão
do Evangelho, o apóstolo Paulo a visitou no ano 50 ou 51, em sua segunda viagem
apostólica. Fundou ali uma comunidade, passando a se corresponder com ela.
Estudiosos da Bíblia concluíram que ele provavelmente tenha
escrito cinco cartas para os coríntios, das quais conhecemos apenas duas. Dadas
as suas novas convicções, Paulo não era bem aceito pelos judeus que ali viviam;
eles não aceitavam o fato de o apóstolo não valorizar a observância de práticas
legalistas e não dar destaque à sua origem judaica. Como a comunidade que ele
ali formara enfrentava muitos desafios, Paulo escrevia-lhe para defendê-la,
animá-la e também adverti-la quanto a algum deslize. Além disso, procurava
justificar sua pregação, esclarecendo que não agia levado por algum interesse
próprio, mas unicamente impulsionado pelo amor de Cristo (cf. 2Cor 5,14).
Há os que se perguntam: quando Paulo se referia ao amor de
Cristo, afirmando que se sentia impulsionado por ele, referia-se ao seu amor
por Cristo ou ao amor de Cristo por ele? É preciso entender sua afirmação nos
dois sentidos, uma vez que o amor de Jesus por ele gerava seu amor por Cristo.
O amor de Deus é sempre o ponto inicial: Ele não nos ama porque somos bons; nos
ama porque ele é bom e é próprio do amor expandir-se. Nosso amor por Deus e
pelo próximo é uma resposta a esse amor. Em outras palavras: nós amamos com o
amor que Cristo coloca em nosso coração. Esse amor nos pressiona, nos compele,
nos impele, nos estimula a amar, dando origem a gestos de doação para com
amigos e conhecidos, para com desconhecidos e necessitados. Ao seguir Jesus
descobrimos que é o rosto de Cristo que está presente no rosto de cada pessoa.
Tendo feito a experiência do amor de Cristo por ele (“Ele me amou e se entregou
por mim” – Gl 2,20), Paulo sentia necessidade irresistível de levar a outros a
experiência que ele próprio havia feito, a ponto de exclamar: “Ai de mim se eu
não anunciar o evangelho” (1Cor 9,16). Diante da urgência da missão
evangelizadora, ele aceitava enfrentar prisões e perseguições, fome, nudez e
calúnias. Para ele, o importante era que Cristo fosse conhecido, amado e
seguido.
É pedida aos cristãos de hoje a coragem de Paulo, mesmo
porque surgiram no mundo novos “areópagos” (cf. At 17,19) – isto é, ambientes
hostis ao Evangelho, onde Cristo está particularmente ausente. Pensemos, por
exemplo, no mundo das comunicações, no da cultura e no das pesquisas
científicas, no ambiente das universidades e das relações internacionais...
Esses, e muitos outros ambientes, precisam ser iluminados pela luz do
Evangelho.
Cristo nos dê, pois, um coração cheio de ardor apostólico,
capaz de evangelizar com novos métodos. É necessário empregarmos nossa
imaginação e criatividade para que o Evangelho chegue a todos, numa linguagem
que atinja o homem moderno. Em outras palavras, cabe-nos anunciar Jesus Cristo
e convidar o povo a converter-se; formar comunidades que escutem a Palavra de
Deus e estejam unidas na oração e na Eucaristia; cabe-nos, também, lembrar a
todos que a evangelização é tanto um compromisso pessoal, já que somos
batizados, como comunitário: “Nisto conhecerão todos que sois os meus
discípulos: se vos amardes uns aos outros” (Jo 13,35).
“Ai de mim se eu não anunciar o Evangelho!” (1Cor 9,16).
Paulo tinha convicção de que Cristo é o único salvador de todos; o único capaz
de nos revelar e de nos conduzir a Deus. Tinha consciência, também, de que nele
o Pai se revelou de forma definitiva, deu-se a conhecer de modo pleno, disse à
humanidade quem é e o que deseja de nós. Por isso, anunciá-lo era a razão de
ser de sua vida. Não deve ser essa, também, a razão de ser da nossa vida, já
que somos os atuais discípulos missionários?...