Dom Murilo S.R. Krieger
Arcebispo de São Salvador (BA) - Primaz do Brasil
O desânimo e a tristeza se abateram sobre aqueles dois discípulos que voltavam
de Jerusalém para Emaús. Eles haviam seguido Jesus de Nazaré e posto nele sua
esperança, mas estavam decepcionados, porque tudo terminara de forma rápida,
inesperada e frustrante. Condenado, Jesus não reagiu; castigado, não se
defendeu; ironizado pelos soldados, não desceu da Cruz para mostrar o seu
poder. Onde ficaram suas palavras, seus milagres e as multidões que o haviam
seguido? O que restava de suas promessas e da esperança que havia despertado em
tantos corações? Para os dois discípulos, só havia uma saída: deixar Jerusalém
e voltar para a sua aldeia. Estavam voltando, na verdade, para sua vida antiga,
sem perspectivas e sem esperança. Foi quando um desconhecido pediu para
acompanhá-los e quis conhecer o motivo de sua tristeza. Tendo ouvido sua
história marcada por decepções, passou a demonstrar-lhes que conhecia as
promessas feitas pelos profetas, que a Cruz e a morte no Calvário, longe de
terem sido o final de tudo, eram um novo caminho que se abria para eles. Suas
palavras eram uma luz para aqueles corações envolvidos por nuvens escuras.
Tendo chegado a Emaús, vendo que o desconhecido ia adiante,
os dois discípulos lhe fizeram um convite: “Fica conosco, Senhor” (Lc 24,29).
Convite feito, convite aceito. Quando o companheiro de caminhada sentou-se à
mesa com eles e partiu o pão, perceberam que ele era Jesus. “Neste momento,
seus olhos se abriram, e eles o reconheceram. Ele, porém, desapareceu da vista
deles” (Lc 24,31).
A explicação das Escrituras, na viagem com o desconhecido,
não havia sido suficiente para abrir os olhos dos discípulos de Emaús. Seus
corações arderam, é verdade, mas o gesto essencial para reconhecerem o
Ressuscitado foi o pão partido e repartido. Foi nessa hora que Cristo revelou
sua identidade. Ao participarem desse gesto de partilha, reconheceram aquele
que durante sua vida sempre se doara aos outros – doação que teve seu ponto
máximo no Calvário.
Os discípulos de Emaús e os primeiros cristãos compreenderam
muito bem a importância das lições deixadas por Jesus; tanto, que se tornaram
“perseverantes em ouvir o ensinamento dos apóstolos, na comunhão fraterna, na
fração do pão e nas orações” (At 2,42). Na “fração do pão”, faziam memória da
vida, morte e ressurreição de Jesus. A instituição da Eucaristia, na noite da
Quinta-feira Santa, havia antecipado, sacramentalmente, o dom que Cristo faria
de si mesmo ao Pai, no Calvário. Agora, em cada fração do pão, essa memória
seria perpetuada pelos séculos afora. A Igreja passaria a viver de Jesus
eucarístico, por ele seria nutrida e por ele seria iluminada. A Eucaristia é
mistério de fé e, ao mesmo tempo, mistério de luz. Sempre que a Igreja a celebra,
podemos reviver a experiência dos dois discípulos de Emaús: “Seus olhos se
abriram, e eles o reconheceram” (cf. EE, 3 e 6).
Os discípulos de Emaús, tendo reconhecido o Mestre, partiram
com alegria para a missão. Deixaram sua aldeia e voltaram a Jerusalém, para se
encontrarem com os outros discípulos, pois queriam comunicar-lhes a experiência
que tinham tido com o Senhor. Tornaram-se, assim, testemunhas do Ressuscitado.
É isso que Jesus continua realizando em cada Missa. Ele transforma seus
discípulos em alegres missionários, anunciadores da certeza que nos deixou:
“Eis que estarei convosco todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28,20). Como
precisamos dessa presença! “Sem Cristo não há luz, não há esperança, não há
amor, não há futuro” (Bento XVI, 13.05.07).
Aproximar-se da Eucaristia é fazer nosso o pedido dos
discípulos de Emaús: “Fica conosco, Senhor!” Como em Emaús, Jesus se senta
conosco, toma o pão, pronuncia a bênção, parte o pão e o distribui. Assim,
terminada a celebração, quando ouvimos: “Ide em paz, o Senhor os acompanhe!”,
somos convidados e nos levantar e a voltar para a nossa Jerusalém,
testemunhando a todos o nosso encontro com o Ressuscitado e enfrentando, com
renovada alegria, nossa missão.